quarta-feira, 10 de janeiro de 2007

Projectar o passado num futuro sempre melhor!

Às vezes o passado assusta mais que o futuro. Mas quando olhamos para trás e percebemos que já se passou tanta coisa (eu nasci em Angola, atravessei uma guerra, observei a luta dos meus pais pela sobrevivência e os sacrifícios para eu poder estar onde estou hoje....????...., não falo só de um passado recente)... onde é que eu ia? ah... olhamos para trás e percebemos que, se estamos vivos e continuamos a acreditar nas estrelas e a encarar o futuro com optimismo, então o porvir não pode ser muito mau.
Mas qual? Tenho 37 anos, não tenho um emprego, sou recém-divorciada, vivo sozinha e, portanto, socialmente, sou uma nulidade. Mas agora olhem as coisas pelo lado positivo. Sou uma mulher com a experiência de 37 anos de vida relativamente bem vivida, posso aceitar estas oportunidades para trabalhar em qualquer lado e por muito tempo (os meus PAIS são, de facto, o meu único travão), estou disponível para amar e tenho uma casa só para mim. Perfeito, não?
Quando a tendência é captar a minha nulidade social, o meu lado positivo sobressai, ou faz um esforço por isso, e reparo como sou a inveja de muitos casados (a maior parte? todos?); e quando digo casados, leia-se socialmente aceites...
O casamento não resultou mas salvou-se ou vai salvando-se a amizade. Talvez nem todas, mas essas são outras histórias (ou estórias?).
A perca do emprego não ajudou à manutenção do casamento e frases como 'podes pedir a tua demissão porque tens um emprego assegurado connosco' ou 'acelera o processo da indemnização porque estamos a precisar de ti' ainda são recorrentes nos meus pensamentos dos tempos ociosos, provando o efeito negativo que a situação provocou. Por outro lado, o facto de estar desempregada deu-me oportunidade de conhecer um mundo que sempre me atraíu e de partir à descoberta de mim mesma.
Aprendi que a lealdade deve ser bem aplicada embora reconheça a dificuldade na aplicação correcta.
O senhor a que me refiro (senhor com minúscula, claro), ofereceu-me um emprego mais tarde, depois de diversos serviços não remunerados prestados às empresas que administra, directa ou indirectamente. Um ano mais tarde... Mas nas entrevistas fizeram questão de deixar bem claro que eu não era necessária, que ia causar problemas no funcionamento do departamento, etc, etc. Já para não falar da função: recrutamento puro e duro; pior ainda: procura e selecção de CVs.
Apareceu a Guiné e deu-me a força para fazer o que eu tinha que fazer: recusar. E aceitei participar na melhor experiência da minha vida. Que se repete ocasionalmente, sempre que participo em mais uma missão. Infelizmente, o espaço entre missões raramente é preenchido com actividades remuneradas e às vezes respirar é difícil e ocasiona momentos destes.
Tenho o hábito de expulsar fantasmas e este há muito que me persegue. Sonho com o assunto e assumo estes sonhos como pesadelos. O que aconteceu transformou-me a vida. Para melhor nalguns aspectos, para menos bem noutros. Ensinou-me algumas coisas mas sei que há erros que se repetem. Não me arrependo de nada do que fiz; provavelmente voltava a fazer o mesmo porque tenho a consciência tranquila: agi de acordo com os meus princípios. Só lamento que algumas pessoas não os tenham tão elevados.
Pronto! Sei que não é assim tão fácil exorcizar espíritos. Mas ajuda. E, quando alguém me perguntar o que aconteceu para eu estar desempregada, posso sempre dar-lhes este link. Acabou!

1 comentário:

Alberto Mendes disse...

Num período de vasta ausência criativa, vejo-me mais incentivado a produzir uma resposta às tuas próprias perspectivas sobre a vida, por estas deixarem-me francamente mais inspirado do que aquelas que sinto pessoalmente na minha vida.
Deve haver qualquer fascínio aqui em jogo, possívelmente uma inveja, por te ver a fazer das tuas adversidades algo unicamente original. Não penso por um momento que ser Ana Paula Afonso seja uma pera doce, mas seguramente pelo que pude constatar, há muitas facetas positivas que compensam largamente os obstaculos que tiveste na tua vida.
Nunca me vou esquecer de em tempos estar francamente deprimido e pensar que não valia a pena fazer esforços para novas actividades pois sentia medo e ansiedade por falhar. Até que me disseram que demoramos uma infinidade a aprender a andar, nunca nos resignando a ficar pelo chão e continuamente persistir com a visão de que vamos conseguir andar.
Um facto real é que andamos.
Porque é que este instincto tão primordial nos abandona só porque desenvolvemos uma consciência, uma razão lógica corruptamente ligada a emoções que nos privam de desafiar a realidade com os sonhos, que tão intrinscamente, estão a gritar por um fio, uma farpa, um resíduo, um átomo, uma esperança de liberdade.
É tão facíl falar nestas coisas contigo, pois sinto uma proximidade com os pensamentos que aqui vais partilhando. Mas não me atrevo a presumir que te percebo, reconheço muito bem o que tu dizes como um eco de sensações que noutro contexto foram minhas, mas que de uma forma muito única são especificas para ti e para mim, com as nossas perspectivas igualmente únicas.
O passado de cada um é a base do presente que assumimos, e o futuro é a tela que temos pela frente para completar com o que a vontade nos permitir.
E assim, para terminar um comentário que se estende para além do razoável sob as malhas de um ego carente de atenção, digo-te: projecta o futuro que desejas, dentro das possibilidades que o hoje te providencia. Contudo, não esperes pelo amanhã para colocares em marcha o que te vai na alma.

P.S. Acho que é por isso que esta nossa intimidade escala exponencialmente ao infinito e mais além, porque projectamos hoje aquilo que poderiamos deixar para um futuro mais além.
Gosto muito de ti! És uma bolha de frescura e felicidade numa "suburbia" que nem sempre partilha as promessas de um novo amanhã, como tu sabes tão sublimente fazer.